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A soberania do Legislativo e a democracia estão em jogo na sucessão no Congresso

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O evento político mais importante do primeiro trimestre de 2021 será a sucessão das Mesas do Congresso. O Poder Legislativo é o principal instrumento de freio e contrapeso à ação discricionária do Executivo. Tem iniciativa e poder de veto, aí incluído o decreto legislativo que tem a faculdade de sustar atos normativos do Presidente da República. A Procuradoria Geral da República é também um importante componente de cheque dos atos do Poder Executivo, mas o PGR atual anulou a autonomia do Ministério Público, subordinando-se aos vetos e preferências do Chefe do Poder Executivo. O Ministério Público tem poder de iniciativa na abertura de investigações de improbidade administrativa e outros atos ilegais de agentes políticos, mas ele tem sido tolhido pelo PGR. O terceiro elo da cadeia institucional de freios e contrapesos é o Poder Judiciário. Na primeira instância, numerosos juízes seguem hoje a agenda obscurantista de Bolsonaro. Alguns ficaram desabusados, após a vitória de 2018, com atitudes discriminatórias em relação a mulheres vítimas de assédio e violência, ou sentenças censurando a imprensa, entre outras irregularidades. Nas instâncias superiores, este alinhamento é menos, mas ainda está presente. No Supremo Tribunal Federal, que tem o monopólio do controle jurisdicional de constitucionalidade, predomina a autonomia. Mas, o Judiciário só pode agir provocado, não tem poder de iniciativa, para declarar algum ato normativo ou ação de agente política inconstitucional, por exemplo. A Constituição diz quem pode entrar com uma arguição direta de inconstitucionalidade (ADIN) ou outros instrumentos que peçam a Suprema Corte para exercer esse controle jurisdicional. Daí a importância de se manter a autonomia do Congresso e restabelecer a autonomia da PGR e do Ministério Público.

A disputa pelo comando das duas Casas do Congresso, que terá seu desfecho em fevereiro, será uma decisão entre a autonomomia e a subordinação; democracia e autoritarismo. Está em jogo a soberania do Legislativo e, portanto, a democracia, da qual é um dos pilares. Na Câmara, formou-se uma frente democrática de oposição à tentativa de Bolsonaro de subjugar a agenda legislativa e de fiscalização e controle, com a conivência do deputado Arthur Lira (PP-AL), nome notório em processos de corrupção e improbidade. Uma candidatura regada a clientelismo, gasto público e subalternidade. Formou-se, em torno de Rodrigo Maia uma frente democrática de defesa da soberania do Poder Legislativo e de resistência à autocracia e à agenda obscurantista de Bolsonaro. A subordinação do Congresso, com a PGR dominada seria um passo enorme rumo ao autoritarismo. O PT fez, finalmente, a correção estratégica de rumo e juntou-se à frente democrática, em lugar de aderir à candidatura da impunidade e da autocracia. Entendeu que não é possível trocar a soberania do Congresso e a história de resistência democrática do partido, por um afrouxamento na lei da Ficha Limpa, para pavimentar, da pior maneira possível, uma eventual candidatura de Lula. O caminho para o PT e Lula é buscar a reparação judicial dos erros processuais que condenaram o ex-presidente. É a única forma de restaurar integralmente e com legitimidade a sua reputação. O PSOL, infelizmente, apesar dos esforços do deputado Marcelo Freixo, ainda não entendeu a gravidade do momento e a natureza da disputa política mais importante de 2021. Formou-se, em torno de Rodrigo Maia uma frente democrática de defesa da soberania do Poder Legislativo e de resistência à autocracia e à agenda obscurantista de Bolsonaro. A subordinação do Congresso, com a PGR dominada seria um passo enorme rumo ao autoritarismo.

Esta mesma clareza de visão ainda não chegou ao Senado da República. O PSDB parece disposto a desprezar sua história, dando os braços ao PSL e ao Podemos para formar um bloco de direita com perto de 20 senadores. Um partido que nasceu da resistência democrática, dos palanques das Diretas Já, que sempre teve um grupo de centro-esquerda atuante e um outro, de centro-direita, liberal-social, admite fazer alianças de baixo valor político e histórico. O MDB, que tem lideranças independentes e a maior bancada do Senado, pode, no vazio deixado pelo PSDB, recorrer à inspiração histórica de Ulysses Guimarães, Mário Covas, Fernando Lyra, Teotônio Vilela, Ramez Tebet, Marcos Freire, Tancredo Neves, entre outros. Estas lideranças deram exemplo de corajosa resistência e de capacidade de se abrir a alianças para a retomada do caminho democrático. Se seguirem esses exemplos, os senadores do MDB podem liderar uma aliança para eleger uma Mesa Diretora independente para o Senado.

O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) perdeu boa parte do seu cacife, ao abrir mão da independência e associar-se a Bolsonaro. O patrocício de Bolsonaro e o apagão, levaram seu irmão Josiel Alcolumbre à derrota para a prefeitura de Macapá. Apesar de sair na frente no primeiro turno, Alcolumbre perdeu para o candidato do Cidadania, Dr. Furlan, eleito com 55,7% dos votos. Sem senioridade, sem prestígio e sem peso político, Davi Alcolumbre não tem o perfil de um “king maker”, capaz de fazer seu sucessor. Ao contrário de Rodrigo Maia (DEM-RJ), que ao postar-se com independência e pragmatismo, assumiu a liderança da oposição na Câmara e reuniu uma aliança entre partidos da centro-direita à esquerda e, se negociar um nome de união, terá condições de derrotar o candidato de Bolsonaro para a presidência da Câmara no primeiro turno.

Assegurada a direção autônoma nas duas Casas do Congresso, será possível reafirmar e fortalecer a soberania do Legislativo diante do assédio de um Executivo autocrático. Um passo decisivo para recompor o funcionamento normal dos mecanismos de pesos e contrapesos. Uma boa iniciativa, seria, para buscar a reqconquista da autonomia do Ministério Público, tornas a lista tríplice compulsória. O presidente só poderia nomear um dos três nomes constantes da lista.