A extrema-direita está entrando em desespero. Ouviu as sustentações da defesa no julgamento do núcleo crucial da tentativa de golpe com a certeza da condenação de Bolsonaro e seus comparsas. Esta não vem da parcialidade dos juízes que tanto apregoam. Vem da robustez das provas e da fragilidade das defesas sustentadas pelos advogados.
Em dois casos, do ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, e do ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Heleno, as defesas incriminaram Bolsonaro. O advogado do general Nogueira afirmou que seu cliente havia tentado demover o ex-presidente de todas as maneiras. A ministra Carmen Lúcia perguntou demover de quê? E a resposta foi “demover de adotar qualquer medida de exceção.”
“Quando o presidente Bolsonaro se aproxima dos partidos do Centrão e tem sua filiação ao PL, inicia-se sim um afastamento da cúpula do poder”, disse o advogado, Matheus Milanez, do general Heleno. Ele seria “cada vez menos demandado para despachar e assessorar o presidente” e sua participação teria passado a ser meramente protocolar.
A defesa interpretou como defesa da eleição o alerta do general ao dizer que “não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições. (…) Eu acho que as coisas têm que ser feitas antes das eleições. E vai chegar um ponto que nós não vamos poder mais falar. Nós vamos ter que agir. Agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas. Isso pra mim é muito claro.” Para a defesa não era incitação ao golpe, mas sim “uma fala com conotação ‘legalista’”. Virar a mesa, agir contra determinadas instituições e pessoas, segundo o advogado significava “após as eleições não tem discussão, quem ganha a maioria dos votos leva”. Infrutífero exercício de malabarismo semântico.
O Brasil viu outro enredo real. O general Nogueira, ao substituir o general Braga Netto no ministério da Defesa, quando este se desincompatibilizou para ser vice na chapa de Bolsonaro à reeleição, convocou os comandantes militares para lhes mostrar a minuta do decreto do golpe. Foram os comandantes do Exército e da Aeronáutica que se insurgiram contra as medidas de exceção. O general Heleno estava sempre ao lado de Bolsonaro.
A minuta completa do decreto que instituía o estado de defesa, previa uma Comissão de Regularidade Eleitoral e um Gabinete de Crise, que substituiria o governo, uma vez que o mandato de Bolsonaro havia terminado e a eleição de Lula seria anulada. Quem chefiaria o Gabinete de Crise? O afastado general Heleno. O general Braga Neto seria o coordenador. O chefe do GSI estava no centro das conspirações e não longe de Bolsonaro exercendo atividades meramente protocolares. Mas defesa tem direito de alegar o que quiser em favor dos réus. A sociedade é que não pode ignorar os fatos e os juízes devem olhar as provas. Só na ausência de provas dizendo o contrário, vence a defesa. Mas as evidências são tantas, e tão bem documentadas pelos próprios golpistas, de tão seguros de si estavam, que as defesas nada puderam fazer se não montar enredos negando a realidade.
Outro argumento recorrente é que nada foi assinado. Certo, por isso o crime é tentar o golpe. Golpe consumado só poderia ser julgado se um dia a democracia retornasse e a sociedade decidisse punir seus algozes. Documentos apreendidos eram “exercícios de devaneio”, “irrelevantes”. Acredite se quiser. A caderneta de campo, a agenda na qual anotava ideias, eventos, fatos, continha numerosas anotações em sintonia com a conspiração pelo golpe do general Heleno. Irrelevante, diz a defesa, pois a agenda “não foi compartilhada”. Não faria sentido, era pessoal. Roteiro para documentos a serem redigidos. Cada frase dita pelos advogados mostrava uma conspiração sem consequências e sem atores. Tramar seria apenas divagação.
O desespero está estampado no projeto de anistia que o centrão quer aprovar. Aliás não apenas o Congresso, mas também o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. O governador não confia na Justiça e foi fazer corpo a corpo pelo projeto. Mostra a cada dia que é um neófito na política. A anistia é inconstitucional. Ela é surreal, perdoa crimes futuros que não se sabe quais, cometidos por quem se desconhece. Só em ambiente de agonia alguém imaginaria tamanha tolice. As condenações virão. A anistia não pode prosperar. Ela agride a lei e o bom senso.