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A miragem da Terceira Via

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O quadro inicial de pré-candidaturas mostra rivalidades em poucos campos e pouca opção para uma terceira via real. A terceira via, até agora, é apenas uma miragem que encanta os arrependidos por terem votado em Bolsonaro. Um nome inventado para dourar a ideia de que parcelas da elite e da classe média alta aceita qualquer um, desde que não seja nem Lula, nem Bolsonaro. Esta parcela do eleitorado votou em Bolsonaro em 2018 e se arrependeu. São eleitores propensos a acreditar em ilusões. Se arrependeram da miragem da eleição passada e estão prontos a seguir atrás de outra.

Até agora, pelo menos, estão se preparando para a pré-campanha o PSDB (desde que consiga chegar ao final das prévias); o MDB, que deve apresentar a senadora Simone Tebet; o partido Novo, com Luiz Felipe D’Ávila; e o Cidadania, com Alessandro Vieira. Já estavam candidatos Bolsonaro, ainda sem partido, Lula pelo PT e Ciro Gomes, pelo PDT.

Os dois candidatos do PSDB, em 2018, na disputa para o governo de seus respectivos estados, estiveram com Bolsonaro. Doria, depois, entrou em choque com Bolsonaro. Mas, continuou na centro-direita. Leite, apenas se disse arrependido do apoio. Mostrou-se incapaz de admitir que a democracia é a prioridade, acima da eficiência do estado. Seu ideal é de uma tecnocracia políticamente iliberal e liberal na economia, não a democracia representativa. O desafio do PSDB vai muito além de conseguir um candidato viável para chegar ao segundo turno e superar as rachaduras que ameaçam o partido estruturalmente. Em 2018, seu candidato a presidente, Geraldo Alckmin, teve uma votação irrisória e o partido elegeu uma bancada anêmica.

Moro, mais que apoiar, foi parte do governo bolsonaro. Ele jamais saiu do campo da direita. É o que é. Continua no mesmo espaço ocupado por Bolsonaro, sem todo o extremismo. Portanto, se tiver êxito em sua candidatura, dividirá com Bolsonaro os votos desse campo direitista e extremo-direitista. Se for realmente bem sucedido, pode tirar Bolsonaro do segundo turno mas, não necessariamente, chegar lá.

Luiz Felipe D’Ávila, tentará ocupar o espaço do liberal clássico, historicamente vazio no Brasil. Mas, seu partido, ficou com Bolsonaro, em 2018, e seu único governador eleito, Romeu Zema (MG), é alinhado ao governo federal. As preferências concretas o posicionam na direita, portanto no território que o bolsonarismo ocupou nesses três anos.

Alessandro Vieira é difícil de definir. Destacou-se pela participação intensa na CPI da Covid, portanto de oposição a Bolsonaro. Aproveitou a controvérsia em torno da PEC dos precatórios, para apresentar uma alternativa muito mais apropriada, em associação com os senadores José Anibal (PSDB,SP) e Oriovisto Guimarães (Podemos,PR). Também adotou atitude de oposição ao orçamento secreto, ao lado do Podemos e de parte do PSDB. Ainda não está muito clara a sua efetiva posição no espectro político-ideológico, mas, provavelmente, estaria na centro-direita, entre o PSDB e o Podemos.

Ciro Gomes, tem tentado se mover para o centro, quase centro-direita, para se posicionar como alternativa a Lula. Mas não abandonou seu projeto nacional-desenvolvimentista, que o define como parte do campo dominado pelo PT. Não precisaria tentar se deslocar tanto para o centro. Se a ideia é rivalizar com Lula, poderia fazer isso da centro-esquerda.
Há muita crítica à esquerda a fazer ao PT. Para isso, seria mais importante atualizar sua visão do mundo e da economia e pensar mais nos desafios postos ao país para o restante do século XXI, do que adotar posturas mais apropriadas à direita. Já perdemos quase um quarto do século enrolados em nossos próprios descaminhos e não surge liderança capaz de encontrar o rumo certo do progresso social, econômico, político e ambiental para o país. Um combo indispensável para seguir adiante neste século.

Simone Tebet é herdeira do MDB clássico, ou autêntico, do qual seu pai, Ramez Tebet foi uma liderança importante. O partido, de tão mutante, quase não guarda nenhum traço do DNA original. Tem um bom pedaço hoje no território do centrão. Simone Tebet é um dos pontos de contato com esse passado mais honroso e se destaca como única representante do campo liberal-democrático. Até agora somente ela poderia reivindicar legitimamente estar em posição equidistante a Lula e a Bolsonaro. Vai precisar intensificar sua exposição pública, criar novos fatos políticos, para tentar melhorar sua pesquisa nessa pré-campanha. Quem não alcançar a primeira fileira de pré-candidatos, pelo menos na faixa intermédia dos dois dígitos na pesquisa, até o carnaval de 2022, dificilmente conseguirá manter de pé a candidatura. A não ser que um início surpreendente de campanha leve a candidatura para uma das três posições superiores.

Logo, não temos, exatamente vários candidatos disputando a primazia de representar o que se tem denominado de terceira via. Temos um engarrafamento na direita e centro-direita, com Sérgio Moro, na mais posição mais próxima à do perfil ideológico de Bolsonaro. Todos, portanto, ocupando um espectro de alinhamentos na área de votação preferencial de Bolsonaro. Um candidato de centro-equerda, Ciro Gomes, na jurisdição eleitoral ocupada por Lula. Apenas Simone Tebet poderia ser considerada realmente uma candidata de centro, portanto equidistante de Lula e Bolsonaro.

A escolha de uma pessoa de convicções democráticas comprovadas e visão social aguçada para ocupar a presidência será crucial para nosso destino nesse perído de turbulência econômica, pandêmica e política. O sistema é presidencialista, porém de coalizão. Para conseguir remendar o país e iniciar a recuperação dos danos causados por Bolsonaro, em todas as dimensões da vida nacional, esta pessoa precisará de governabilidade estável. Logo de uma coalizão com o mínimo de heterogeneidade possível e o menor número necessário para forma a maioria, para que seja gerenciável. Este desafio é de todos os partidos. Terão de lutar duramente para aumentar suas bancadas. Nesta legislatura, as bancadas foram miniaturizadas e não dão liga para uma coalizão viável. Este desafio é tão sério para nosso futuro democrático quanto o de eleger o ou a presidente.