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PSDB escolhe mudar, sem mudar no essencial

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Os partidos no Brasil mudam de nome, mas raramente mudam de atitude. Resistem a rever o conteúdo de sua ação política. O PSDB nunca cogitou de mudar o nome e parece ter decidido não mudar de atitude ou conteúdo da ação política para valer. Preferiu não enfrentar suas contradições internas, numa disputa democrática pelo comando político do partido, e novamente conciliar posições que, aos olhos do eleitorado, podem ser irreconciliáveis. A pergunta fundamental que todos no partido se recusam a responder diretamente é: o que fazer com Aécio Neves, os ruralistas e os fisiológicos do partido? Sem responder a essa questão estratégica central, o PSDB permanecerá no estado gelatinoso em que se encontra. No calor eleitoral, pode se dissolver em suas própria contrariedades.

Há muito, o PSDB abandonou sua posição social-democrata. Não é pecado. Entre suas alas que pensam, domina hoje uma orientação social-liberal, perfeitamente legítima. É o partido do social-liberalismo brasileiro. Mas tem uma banda larga que não pensa, só age por interesse próprio ou espúrio.

O acordo interno e o posicionamento do partido são defendidos em nome das virtudes de ser o centro. No caso do Brasil atual, o centro pode definitivamente não ser a posição mais virtuosa. Primeiro, há muitos disputando o centro. Essa multiplicidade de versões do que seria o centro termina por desmentir a todas elas. Segundo, a virtude do centro não está simplesmente em ser a posição intermédia. Ela depende das posições e dos valores que o centro defende. Terceiro, a própria noção de “virtude” ou “virtuosa”, como ocorre com a noção de racionalidade, pode justificar escolhas nada recomendáveis do ponto de vista o interesse coletivo.

O presidente Temer e seu grupo, por exemplo, estão articulando um centro tipo “centrão”. Lançaram como balões de ensaio os nomes do ministro da Fazenda Henrique Meirelles e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Apostam que a melhora da economia poderia favorecer o governismo. Afirmam que esta seria a posição de centro. Estariam até dispostos a aceitar que o candidato desse centrão fosse o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, desde que o PSDB controlasse aqueles que desejam abandonar o governo. A esperança de que a melhoria da economia beneficie uma candidatura governista sem disfarces pode se frustrar. Com a rejeição da população à prática política vigente e à corrupção, Temer pode descobrir que “não é a economia, é a política…”.

Nos termos palacianos, o centro é o governismo. É evidente que, sem outras graduações, dadas as pré-candidaturas postas, Bolsonaro ocuparia a posição de direita. O PT é visto como a posição de esquerda. Logo sobraria ao governismo autoproclamar-se como o centro. Poderia ser identificado como o centro nessa hipótese. Mas um centro vicioso, como tentarei argumentar.

O caso do PSDB, é curioso. As definições para o partido e para o país se equivalem. Tanto no partido, quanto no país, a virtude de um centro reformista estaria em romper politicamente com o statu quo. O partido, vale lembrar, até a convenção, continua sob o comando do senador Aécio Neves. Ele encarna o statu quo. Confrontou o senador Tasso Jereissati e impôs em seu lugar outro vice, o ex-governador Alberto Goldman, que passou a defender, com veemência oratória, o acordo interno e uma espécie de statu quo mitigado pela eleição do governador Alckmin para a presidência do partido. Alckmin dificilmente não será o candidato tucano à presidência. Com apoio do ex-presidente Fernando Henrique e de boa parte da cúpula fundadora do partido, o acerto proposto por Goldman prevaleceu. O governador Alckmin se apressou em definir uma chapa que encabeçaria, como a alternativa do centro e, para viabiliza-la, propõe uma aliança com o DEM e o PMDB. Mas terá virtude esse centro, ainda que aparentemente distante do governismo? Ou será, ao contrário, uma versão muito piorada da “continuidade sem continuísmo”, com a qual José Serra disputou a presidência com Lula, em 2002, querendo manter-se distante do governo Fernando Henrique?

No quadro político atual, em que o PMDB controla um centrão voltado para assegurar a impunidade dos crimes de corrupção política e para a preservação do conluio oligárquico, intrinsecamente fisiológico e destituído de qualquer barreira moral, não basta afastar-se amigavelmente do governo. É preciso romper com o governo e com o grupo que domina o PMDB. É, aparentemente, o que Tasso Jereissati propunha, contra a posição da facção aliada a Aécio Neves. Sem a ruptura com o PMDB, qualquer proposta política de centro não passará de uma versão da fórmula de Tancredi, celebrizada por Lampedusa em seu magistral O Leopardo, para as coisas ficarem com estão, é preciso que mudem. No caso, trocar o ocupante peemedebista do palácio do Planalto, por um tucano. Se o eleitor concordar e eleger o candidato do PSDB e, além disso, também não rejeitar o PMDB nas eleições legislativas, este último continuará sendo o pivô de qualquer coalizão de governo e as coisas mudarão, para ficarem como estão.

A virtude do centro, está no conteúdo que seu ocupante imprimirá ao processo político e às políticas públicas. Imaginemos que haja duas réguas para medir o “reformismo” ou o grau e o tipo de mudança que se pretende, como na figura abaixo. No primeiro caso, a régua se refere ao dilema do partido. A posição de “direita” ou, digamos, “-1”, seria deixar tudo como está. A posição de “esquerda”, ou digamos, “+1”, seria confrontar os continuístas, eliminar os gravemente envolvidos em casos de corrupção e refundar o partido, seja como social-democrata, seja como social-liberal. A posição de centro, ou “0”, corresponderia a acomodar e mudar, sem mudar o essencial. Ganhou, aparentemente, a posição de centro. O centro teria peso “0” de virtude, logo um centro sem virtude.

PSDBdiagrama

O segundo caso, seria do país. A posição “governista”, a “direita”, representaria a manutenção do statu quo oligárquico-fisiológico e a impunidade dos culpados por corrupção política. Ocuparia a posição “-1”, na régua. A posição à “esquerda”, seria de ruptura com o governismo e o conluio oligárquico, logo “+1”. O centro seria, novamente, aquele que acomoda e muda, sem mudar o essencial, “0”, logo o centro sem virtude.

Resta saber se o eleitor se contenta com a opção por mudar, sem mudar no essencial ou se quer mais virtude na política.