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2017: o ano do retrocesso ecopolítico

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Foi um ano de muitos retrocessos e poucos avanços no campo ambiental e climático, no Brasil e no mundo. No mundo, o destaque negativo ficou para Donald Trump, que deixou o acordo de Paris, reverteu as políticas de controle de emissões de Obama, promoveu vasto retrocesso no controle da poluição do ar e na pesquisa climática. Desmantelou a EPA, a agência ambiental americana, desinstrumentalizou o famoso Clean Air Act, de 1963 que, atualizado sucessivamente, é um marco na legislação contra a poluição do ar. Investiu contra a ciência climática. Um cardápio completo de velharias e atrasos que dificilmente se repetirá na história do século 21.

Foi um ano de grandes tragédias no encontro entre a natureza e o ambiente (mal) construído pela sociedade humana, de incêndios florestais destruidores e fatais na Europa (Portugal, Espanha e Grécia, principalmente) e na Califórnia. Foi uma temporada de furacões mortais no Golfo do México e na Ásia.

No Brasil, para atender a empresas mineradoras, o governo Temer extinguiu a Reserva Nacional do Cobre e Associados, a Renca, redescoberta pelo Brasil. Trata-se de uma reserva mineral na calha norte do Amazonas, criada em 1984, no regime militar, para estatizar a exploração de cobre e ouro, por meio do monopólio estatal. Com a privatização da Vale, então a principal interessada, o monopólio estatal virou uma reserva ambiental em uma área sensível que tem sobrepostas ou vizinhas a ela nove unidades de conservação e duas terras indígenas. A reação contrária foi enorme e o governo foi obrigado a recuar e revalidar a Renca. A sociedade civil conseguiu interromper a marcha da insensatez, neste caso.

O governo Temer é dominado por ruralistas, que ocupam vários ministérios e postos-chave, não apenas na Agricultura, como costumava acontecer. Movida pelos interesses do campo obsoleto, a agenda do atraso avançou. A Funai foi desmontada. A demarcação de terras indígenas passou a ter um marco temporal que, na verdade, corresponde à desapropriação de território originalmente indígena para fins privados, porque só serão demarcadas terras que estavam ocupadas a partir de 1988. A grilagem de terras foi anistiada, mas a medida está sub judice porque o ex-procurador geral da República, Rodrigo Janot, entrou com uma ação de inconstitucionalidade contra a medida, no finalzinho do seu mandato. A pauta de redução de unidades de conservação também seguiu adiante. Foi um péssimo ano, do pior governo para o meio ambiente, desde os militares. Era difícil ganhar do governo Dilma nesse recorde do péssimo, mas Temer conseguiu.

O governo Temer e seu principal aliado, a bancada ruralista, também propuseram a redução de quase 1 milhão de hectares em áreas protegidas da Amazônia e na Mata Atlântica. O alvo principal foi a Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará. Ela já vem sofrendo invasões e desmatamento, que se intensificaram com o incentivo da ação governamental. A proposta gerou forte oposição e provocou advertência do governo norueguês ao Brasil, que acabou cortando 50% dos recursos que aporta ao Fundo Amazônia. O projeto de lei propondo o corte de 350 mil hectares do Jamanxim, uma das maiores reduções de área protegida já propostas está tramitando na Câmara. Várias emendas de ruralistas buscam ampliar a área a ser desafetada e reduzir as salvaguardas ambientais.

2017 registrou o maior número de queimadas em toda a história desde que o Brasil começou o monitoramento com satélites, em 1988. O pico anterior havia sido em 2004. Fogo nas matas brasileiras, nunca é espontâneo. É coisa de bicho humano, seja para desmatar, seja para limpar pasto. Com o aumento das temporadas secas, ficou mais destrutivo. Mas, tem sido assim, desde sempre. A queimada é uma velha praga, como a corrupção. Monteiro Lobato foi o primeiro a descrever com precisão, essa tragédia ecológica, em Urupês. Falando da queimada de 1914 na Serra da Mantiqueira, escreveu: “terrível ano de seca foi aquele! O fogo lavrou dois meses a fio, com fúria infernal. O céu toldado, o ar espesso, o crepitar permanente das matas em chama, a fumarada invadindo a casa, os olhos a arderem… Um fim de mundo. E sempre notícias más, a toda hora”. Mais adiante, conta ele que a “Serra da Mantiqueira ardeu como ardem aldeias na Europa” (referindo-se aos bombardeios na 1a guerra mundial) “e é hoje um cinzeiro imenso, entremeado aqui e acolá de manchas de verdura – as restingas úmidas, as grotas frias, as nesgas salvas a tempo pela cautela dos aceiros. Tudo mais é crepe negro”.

Depois de ficar quase parado em 2016 por falta de recursos, o Ibama retomou as atividades de fiscalização ambiental, financiado pelo Fundo Amazônia. Ajudou a articular um projeto de lei de licenciamento ambiental que contraria os ruralistas. Vetou a exploração de petróleo na foz do Amazonas. Aumentou a fiscalização contra o desmatamento. A retaliação foi na força bruta. A gerente regional do Ibama de Santarém (PA) foi ameaçada de morte na região da BR-163, palco de uma série de passeatas e protestos contra a fiscalização. Em julho, dois caminhões carregados com picapes do Ibama foram emboscados e incendiados por madeireiros em Novo Progresso, no Pará. Em outubro, uma ação de garimpeiros incendiou os prédios do Ibama e do Instituto Chico Mendes em Humaitá, no Amazonas.

O Brasil foi a única grande economia do mundo que aumentou as emissões de gases de efeito estufa embora em recessão econômica. A elevação de 9% se deveu ao pico de desmatamento na Amazônia – alta de 27% no ano passado. No setor de energia, houve uma queda de 7,3%. O Brasil é o sétimo maior poluidor do planeta.

No finalzinho do ano, veio a notícia boa. Dois leilões de energia foram dominados pelas fontes renováveis não-convencionais. No dia 18, pela primeira vez foram contratadas usinas solares a preços médios abaixo dos preços das hidrelétricas. O preço médio das solares foi de R$ 145,00, contra um preço médio de R$ 219,00 para as hidrelétricas. No pregão de 2014, último no qual entraram as solares, o preço médio havia sido de R$ 245,00. Isso mostra como a energia solar se tornou competitiva. 2017 pode ter sido o ano da decolagem na energia solar e 2018 pode ser o primeiro ano solar, no país do sol. Demorou.